Houve o romantismo da fase de olhar pra dentro, entender o "não-acaso" de uma pandemia, da alastrada doença mundial, o despertar de uma consciência de higiene coletiva, saúde, solidariedade, inclusão, humanização, mas sobre tudo isso já deu. Deu nosso limite do "aguentar com serenidade", de falar em empatia, tendo cada barco suas dificuldades e particulares para navegar, uma disparidade de conforto, comida, trabalho, renda, amor, companhias e amizades, tecnologia, saneamento básico Brasil.
Pirei já no segundo mês, quando enclausurada nesse meu mundinho confortável, vida interiorana de SP que escolhi, entendi que era tudo ilusão. Não dá pra ser feliz no digital. Não dá pra acreditar em relações estritamente virtuais. Ficamos de saco cheio. Em maio de2020, o futuro da humanidade era um breu, as lives de música ainda eram novidade e entretenimento era garantido como forma de "pausa" na vida corrida e "estar em família". Quem disse que fomos criados nos anos 70, 80, 90 para conviver 100% do dia com a família, com o mesmo repertório, com a mesma rotina?
O futuro chega todo dia, e maio virou junho, que completou o semestre, que não tem luz pra 2020, e a pandemia se instaurou em nossas vidas, não passou, não foi fase, tá sendo vida que segue! Responsáveis? Somos nós, todo mundo, individualmente, mas a real é que não aguentamos mais viver na expectativa de liberdade, carrecarmos a culpa pela falta do bom senso de vida conectada à natureza, do respeito aos animais, do extrativismo e tantos comportamentos predadores que temos.
A briga política já era insuportável, só piorou. Os apontamentos de dedo no nariz ganharam mais força e a tal Era do Dia tem deixado tudo mais claro para enxergarmos, mas continuamos na escuridão da COVID, com fé, esperança que nasce e morre várias vezes no dia, mas continuamos fingindo naturalidade e bem-estar.
É um não aguentar emocional após 120 dias de experimentação de um cárcere privado cheio de mordomias, casa, cobertor, comida quentinha, filhos, sofá, que lindo, mas é confinamento. A aceitação é o remédio mais apaziguador dos sintomas, mas é uma doença, uma tormenta nunca vivida nem pensada, é uma experiência que se prolonga, não tem mais novidade pro autoconhecimento, a intolerância ganha espaço e o estresse se alastra como água. É um não querer viver preso, sem o direito de ir, vir, sair, usufruir da TERRA e apenas estar nela, do lado de fora da esteira do aeroporto vendo a vida passar. É não abrir repertório, não conhecer da vida, e colocar essa responsabilidade no auto-didatismo, atrás de uma tela, é a vida de uma grande maioria sendo abalada com questionamentos que dilaceram o emocional.
Me pego pensando e buscando luz no final do túnel e nem vejo mais túnel, parece um abismo.
Um recomeço, um novo viver, não tem prazo, só tem meio. Sobre luz creio na do sol, nas energias positivas que jogamos pro universo, mas é preciso se entregar pra verdade de que a angústia, a ansiedade, a intransigência de viver uma situação dessa, destrói o emocional de alguns menos fortalecidos, acaba com sorrisos, destrói relações. Não é sobre sentimentos de todos, é de uma boa parte humana que precisa respeitar que o vírus tem sido mais forte que a humanidade.
Às mães não há acalanto, é vida de multitarefa e eu tô nessa. Choro, engorda, desmotivação, tudo estampado com fotos de felicidade e harmonia para ser otimista, para estampar positivismo e fazer seus amigos, as pessoas que você aprecia e ama, acreditar na vida. Com rede de apoio por perto, há as que seguem a maré num barco com remadoras ajudantes, porém, existem as isoladas nos campos de batalha silenciosa com gritos estridentes para ir escovar os dentes, desligar a TV, fazer a lição, tirar o prato da mesa, parar de sujar a casa. É possível fazer Ioga, correr, estudar, fazer lições pacificamente por 4 meses em casa? Não confio nesse sim. É tudo um grande teatro.
Àquelas progenitoras que como eu são por si só, que lutem! Não tem a ver só com solidão, com insatisfação e aprisionamento. É sobre ser mãe e querer ter vida também, ser esposa que nem aguentamos mais muitas vezes de longa data, pedagogas, que abri mão de tanta aula online, lavadeira, arrumadeira, diarista, cozinheira, e bem humorada, linda, cheirosa e bem disposta. Não dá não meu Brasil. Olhei pra mim e assumi, não pire, faltam pouquíssimas gotas pra isso ser sério. Tirar as crianças do colégio, mandar pra órgãos públicos e ter a resposta: aguenta aí mãe, só voltaremos em janeiro mesmo! É um soco no estômago, é o âmago da vida futura de amanhã ser o cenário do seu hoje.
Vivi com uma geração que deu conta desse homeoffice, desse isolamento maternal, com a vara e chinelo na mão, sem mimimi de direitos humanos e conselho tutelar. Minha mãe foi tudo isso, sem pandemia, com o apoio de uma escola por meio período, paga muitos anos pelos impostos devidos, e ela dava conta com violência mesmo, com chineladas, cintadas, castigos, e não sou pior por isso, mas não sigo o modelo pelo meu contexto 2020, pelo social, por não acreditar que resolva, mas ela conseguiu. O cenário mudou, não comparo meu hoje, com mães, avós dos anos 80, isso é desleal.
Aqui sigo aos gritos, aos surtos com a molecada, com a busca de concentração para ser a comunicóloga e marketeira que quero e preciso me manter e parcialmente tô sendo dentro do possível, com vários picos de desejo de desistir. Não na essência não sou dessas! Mas de verdade, parei de falar que "isso vai passar". Só DEUS mandando uma mensagem em português de que vai passar mesmo, que é tudo processo.
É entender sobre tantas reflexões nessa maré que não dá peixe nenhum, apenas aprendizados, reflexões, mas que exige ações porque os boletos continuam vencendo. E também sigo no caminho da imperfeição, sem a ilusão da mulher maravilha, tentando não olhar a grama do vizinho, mas sentindo as dores dessas jardineiras todas, cada uma com seu jardim pra cuidar.
Momento de cuidar da espiritualidade sim, confiar, acreditar, mas também explodir, ser humana e não uma semideusa que não sente dor nem solidão, que já tava preparada pra tudo isso por isso quando perguntam: e como andam as coisas? Tá tudo ótimo! Princípio da positividade de Hoponopono, tá tudo sempre muito bem.
As barcas são completamente diferentes minha gente. Na real, são mais de 7 bilhões de seres humanos, cuja grande maioria não conhece a realidade da Serra Leoa, nunca esteve em Beveru Hills, e não sonha o que é Rocinha e Heliópolis. Tem bilionário estourando, tem empresária passando fome, tem suicídio e tem baile funk clandestino. Então, cada um tem encarado conforme suas preocupações, seu contexto, sua história, suas crenças e o que valoriza. Somos todos únicos, em canoas, iates, cruzeiros, Titanics e botes infláveis, caminhando pra mesmo direção, sobreviver.
Não tá fácil não.
Não tá simples.
Tá difícil mesmo.
Talvez eu grite, e não resolve de nada.
Sempre choro, e também sinto apenas dor de cabeça e não alívio.
Às vezes você lembra que tem amigos, mesmo há meses sem vê-los. E sim, é preciso vê-los.
A gente medita, tem fé, reza, fala em positivismo, em otimismo, mas de verdade, a vontade aqui é de gritar com o mundo pra desabafar, é chorar pra Deus para acalantar e buscar forças para continuar fingindo que acredito na frase "vamos sair melhor dessa". Nananinação, não é pra todos não e tem mais de 70 mil só aqui nessa imensidão de País que nem vão sair dessa porque já desencarnaram. E há os que digam que já eram pra eles irem mesmo. É a representatividsade de 300 aviões , mas sigo dizendo isso pro mundo, pra convencer a mim mesma. A tempestade vai amenizar, a tormenta é pra todos. Cuidemos dos nossos barcos e os que estão mais próximos.
Amém.
Por Nádia Maekawa
Um tapa na cara da realidade pintada de Instagram. Uma rotina massacrante numa vida que já não era justa, onde todos preferem pintar de colorido sua própria história que na verdade é preta e branca (só p mostrar aos outros...
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